23 de janeiro de 2013

17ª Exposição Individual - Galeria da Academia Dominguez Alvarez, Porto - 1961

“O ensino de gravura-artística na Academia Dominguez Alvarez e a abertura da Exposição de desenhos e pinturas de Mestre António Soares”

Novembro de 1961

A Academia Dominguez Alvarez iniciou a nova temporada de actividades, com dois acontecimentos de vulto para o meio artístico portuense. Um, foi a inauguração da oficina-livre de gravura artística, dirigida pelo pintor D’Assunção, e que já está a ser frequentada por vários “alunos”, entre os quais alguns da Escola de Belas Artes; outro, a abertura da exposição de desenhos e pinturas de Mestre António Soares, que juntou na Academia Dominguez Alvarez dezenas de intelectuais tanto das letras como da Poesia e das Artes Plásticas. Companheiro de Jorge Barradas, Almada Negreiros, Canto da Maia, Christiano Cruz, Mário Eloy e Eduardo Viana, o Mestre António Soares é, presentemente, um dos mais representativos valores portugueses, estando representado em museus e pinacotecas particulares de Portugal e do estrangeiro, bem como no Gabinete da Presidência do Conselho no Palácio da Assembleia Nacional, nos Paços dos Duques de Bragança, em Vila Viçosa, no Patriarcado de Lisboa e na Capela do Cristo-Rei do Seminário dos Olivais, sendo detentor do “Grand-Prix” de Paris, da “Medalha de Honra” da Feira Internacional de New York, primeiras medalhas de desenho e pintura da S. N. de Belas Artes e do “Prémio Columbano”. O Governo Português distinguiu-o também com a "Ordem de Santiago e Espada”.

No acto inaugural da Exposição de António Soares, o pintor Jaime Isidoro saudou o ilustre Mestre, dizendo:

Se a hora a que nos reunimos para inaugurar esta exposição me obriga, de facto, a dizer “boa-tarde”, a qualidade, a frescura, a permanente juventude, aliciante e comunicativa, da obra exposta, que sugere perfumada e luminosa manhã de eterna Primavera, leva-me a esquecer a posição dos ponteiros no relógio que regula o tempo e orienta a vida, impondo-me este desabafo sincero, saído do fundo da alma:

- “Boa-tarde!”, Senhoras e Senhores.

- “Bom-dia!” Querido Mestre.

As pessoas aqui presentes, que representam muitos e dos bons admiradores da Arte como esta, com características de uma singular e nobre expressão, vieram à Academia Dominguez Alvarez para levarem os olhos e o espírito com tão sublime atmosfera; com esta pequena parcela de trabalhos do Mestre António Soares, constituída, no quase todo, por estudos e desenhos preparatórios de algumas das suas obras que nos falam alto e claro do sonho do Artista – sonho de meio século, suave e puro, sem sombra de pesadelos a perturbar-lhe a ascensão gloriosa no panorama da Arte.

É para essa ascensão gloriosa, reconhecida pelos valores responsáveis dos meios artísticos de Portugal e do estrangeiro; é para essa ascensão gloriosa que os júris nacionais e internacionais têm distinguido com altos galardões, que a Academia Dominguez Alvares, convencida que presta um serviço à cultura, pretende chamar a atenção do público nortenho, esperando que ele desfile por estas salas com interesse e carinhosa devoção, prestando assim, com a sua presença consciente, mais uma e sempre merecida homenagem a quem, como o Mestre António Soares, tem sabido servir a Arte com verdadeiro amor, dando-lhe vida, dando-lhe espírito e dando-lhe alma com inspirado carinho e com um certo, requintado e poético sentido criador.

Ao saudar o ilustre Artista que acedeu ao meu convite, e ao agradecer a presença de quantos quiseram dar o seu apoio moral, vindo, como visitante, à Academia Dominguez Alvarez, eu quero terminar conforme principiei:

- “Boa-tarde!”, Senhoras e Senhores.

- “Bom-dia!”, - Querido Mestre.




Por sua vez, o Mestre António Soares usou da palavra para fazer oportunas e judiciosas considerações, sublinhando:

São de reconhecido agradecimento a Jaime Isidoro, Director da Galeria Dominguez Alvarez, as primeiras palavras que tenho a honra e o grato prazer de dirigir aos visitantes da minha décima-sétima exposição, por tanta gentileza e cativante interesse em efectivá-la na sempre bem acolhedora capital do Norte. Como longínquo romeiro da fé na amizade e nos fastos da beleza evocadora, é sempre com emoção que venho avivar aqui, o sentimento de fraternal convívio à lareira nortenha, ao secular granito da invicta muralha da fundação e também à singela esteira de lages das ruelas e escadarias da ribeira do velho burgo. Foi com efusivo entusiasmo que aceitei o convite de Jaime Isidoro, e alvoroçado agrupei o conjunto de trabalhos que ora vos apresento e tanto diligenciei, embora resumidamente, significar o largo adágio de quarenta e seis anos de actividade artística, o que equivale a dizer-vos… de sonho.
 

Publicado em “Jornal Feminino” – Secção A Mulher

 
Das palavras acima transcritas, saliento um facto extremamente interessante, a nível psicológico e sociológico: quando António Soares, em 1961, com 67 anos de idade se refere a “quarenta e seis anos de actividade artística”, é fácil fazer as contas e chegar à conclusão de que ele se considerava um profissional pleno desde os seus… 15 anos!

O que quero com isto salientar é o facto de, actualmente, estarmos tão condicionados a considerar que um profissional só o é verdadeiramente “depois dos 18 anos” ou mesmo ainda mais tarde, então o que dizer deste grupo de jovens (Jorge Barradas, Christiano Cruz, Almada Negreiros, Canto da Maia...) que tanto “barulho” fazia nos seus verdes anos, contra as ideias “bolorentas” e tão “bota-de-elástico” da época; que provocaram a reacção do público com o humorismo satírico e vernáculo patente nas 1ª e 2ª Exposições dos Humoristas Portugueses, em 1912 e 1913… tão jovens!

E que geração fantástica!

E se trabalhavam!... António Soares, a quem o Pai tinha posto fora de casa por considerar que a sua teimosia em querer viver da sua própria arte, da pintura e do desenho, não era coisa de pessoa séria… e que anos mais tarde, vem a ser o provedor de toda a família, e inclusive do seu próprio Pai que, enganado por um sócio manhoso, perde todos os bens… (mas isto já é outra história).

Todos eles, todos estes artistas, pintores e desenhadores de génio, se fartaram de trabalhar – era tudo feito à mão, não por computador - no teatro (cenários, figurinos, cartazes), em publicidade (o que hoje em dia se designa por “graphic design”) de Vinhos, de Cintos, de Discos, de Bolachas, de Revista (capas e não só, também publicidade no interior) enfim no que aparecesse...

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