28/Maio/1928
A SOCIEDADE NACIONAL DE BELAS
ARTES ABANDONOU A SUA POLÍTICA DE FEROZ ISOLAMENTO, DIZ-NOS UM DOS SEUS
DIRECTORES, O PINTOR ANTÓNIO SOARES
António Soares, pintor de
merecido renome, director da Sociedade Nacional de Belas Artes, falou-nos hoje,
sobre a exposição dos artistas portugueses em Viena de Áustria.
A entrevista começou por estas
palavras:
– Portugal artístico…
– Viveu sempre num grande
isolamento, chamado concerto de actividades que giram em volta do progresso
artístico.
– Concerto, cheira a lugar
comum. E se falássemos do papel da Sociedade Nacional de Belas Artes, e o que
ela tem feito, pró ou contra esse… concerto.
Rimos, ambos, concordámos em
riscar a palavra concerto, e arquivámos esta afirmação:
– A Sociedade Nacional de Belas
Artes, até há pouco tempo, conservou propositadamente, sob o pretexto de um
inadequado tradicionalismo, a arte nacional, sob a pressão de uma política de
feroz isolamento, como se do contraste entre a nossa arte e a dos outros
países, não resultasse uma maior diferenciação benéfica para o prestígio da
nacionalidade.
O COMBATE À ARTE MODERNA
«O resultado foi que o
desenvolvimento e progresso artístico se anularam por falta de estímulo.
Atrasamo-nos tanto em relação às variadas expressões da arte moderna, que os
chamados artistas modernistas chegaram a ser combatidos quando pretendiam
revelar processos de realização que lá fora, ou já tinham sido consagrados, ou
já estavam “démodés”.»
«Esse combate assumiu um
aspecto grave. Tudo quanto representasse desarticulação de processos, arrojo no
sacudir de convencionalismos, foi tomado como estrangeirismo,
desnacionalização.»
– Crê que da entrada de
Portugal, no tal concerto das actividades artísticas da Europa, resulte numa
vantagem para o ressurgimento da arte portuguesa?
– Absolutamente, à falta de
outro tomo mais categórico.
«A arte é uma actividade
coordenadora do espírito. A arte assume no mundo do Pensamento, o papel que a
Beleza representa na vida: Dignifica. Ela é o equilíbrio lógico entre a vida
prática e a faculdade de idealizar.
«Discordamos deste modo, da
opinião de algumas pessoas com responsabilidades que sustentam que a maior
falta do país, é a falta de… géneros de primeira, e não de arte, que poderíamos
muito bem dispensar.
«A Áustria ainda não asfixia da
inflacção que chegou a merecer do mundo um clamor de piedade, subsidiou
largamente, e de que maneira!... a sua representação industrial e artística na
Exposição de Paris, de 1925.»
– Das Artes Decorativas?
A ARTE E A VIDA ECONÓMICA DAS
NAÇÕES PRÓSPERAS
– Isso. Para se avaliar da
importância de tal concurso, bastaria relembrar que o livro oficial dessa
representação era subscrito por cinco ou seis homens públicos, dois deles umas
vezes presidentes de conselho, e um outro ministro dos Estrangeiros, não
falando dos restantes, que (é) muito possível que tivessem sido ministros das
subsistências. Todos eles afirmavam que o desenvolvimento industrial, e, portanto,
a economia nacional…
– E os géneros de primeira…
– Dependem do desenvolvimento
dado às artes.
– É chegado o momento de
voltarmos a falar da Sociedade Nacional de Belas Artes.
– A actual direcção pensa como
nós, e à sua nova orientação deve a situação magnífica que começa já a
disfrutar no reconhecimento oficial, por parte de países mais adiantados do que
o nosso em matéria de Belas Artes.
Evocamos a participação de
Portugal na Exposição de Viena de Áustria.
OS ARTISTAS QUE VÃO A VIENA DE
ÁUSTRIA
– Tudo isto não seria possível
sem a colaboração dos raros que neste país mantêm a tradição do talento e da
inteligência. O artista do nosso país é um ser sem existência nem especial
relevo na vida oficial e social. Faltava-lhe o impulso de pessoa de categoria
mental e situação oficial que se prontificasse a valorizar o seu esforço e a
conduzi-lo através dessa Europa que desconhecemos e nos desconhece também.
– E esse homem apareceu?
– Na pessoa do Dr. Veiga
Simões, velho amigo dos artistas do seu e do nosso país.
«À brilhantíssima exposição de
“Ex-Libris”, seguir-se-á o intercâmbio artístico entre Portugal e Áustria.»
– Quando?
– Falta designar a data em que
essas festas se realizarão. Calcula-se, contudo, que dados os nossos afazeres
com a Exposição de Sevilha e Salão de Outono, os artistas austríacos devem
fazer a sua exposição em Lisboa no começo do ano de 1929.
– E os nossos? Quem vai à
Áustria?
– Assentou-se para a Exposição
de Sevilha que não há novos nem velhos. Há artistas que têm valor, e os que não
têm. Assim, todos os (que) valem irão. Depois de muita discussão assentou-se
nisto.
– É um bom princípio.
É um rico fim de entrevista…
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