18 de outubro de 2013

"Ofícios" e "As Artes, as Letras e as Ciências" - no Palácio da Assembleia da República

O tema "deambulatório" não cessa de me vir à cabeça. Com efeito, se pensar bem, há muitas obras do Mestre António Soares que ficam em "locais de passagem", como o Painel da Escola Secundária Engº. Ferreira Dias, no Cacém - localizado na Recepção da Escola; ou os painéis da Escola Secundária Dr. Solano de Abreu, em Abrantes - cujo espaço começou por ser o Ginásio da Escola, local onde passaram imensos jovens nas suas aulas de Educação Física, e que é agora o Grande Auditório.

No ano passado, aquando da extraordinária exposição "O Modernismo Feliz - Arte Nova em Portugal" que teve lugar no MNAC - Museu do Chiado, a maior obra exposta foi uma pintura a óleo, enorme, que foi designada por "A Agricultura, o Comércio, as Indústrias" e datado de 1933, e que segundo o nosso registo é designada por "Ofícios" e foi realizada, efectivamente, em 1935. Lamentavelmente não tenho ainda uma foto adequada, só uma que tirei aquando da referida exposição.


Noutro dia, por razões profissionais, fui participar num workshop precisamente na Assembleia da República. Ao passar por um corredor, por sinal relativamente largo, dou exactamente com esta obra, e com a que foi encomendada na mesma ocasião que emparelha com esta, designada por "As Artes, as Letras e as Ciências", também, claro de 1935. Os quadros são tão grandes que o corredor não permite um recuo suficiente para uma foto total. Só como registo, até conseguir um melhor, que espero me seja providenciado pela Directora do Museu da Assembleia da República:


E aqui estão mais duas obras... num "local de passagem"...


Escola Básica Raúl Lino - "Os Ofícios de Alcântara"

Por associação de ideias, ao escrever o post anterior, o nome do local onde se encontra a pintura no Seminário dos Olivais - Deambulatório - fez-me recordar "local de passagem", local "onde se caminha" e um outro local, onde existe uma pintura mural desde há muitos anos, desde a sua inauguração a 1 de Setembro de 1918 - a antiga Escola da Tapada, ou Escola de Alcântara, e que actualmente se chama, muito apropriadamente, Escola Básica Raúl Lino. 

Situada na Calçada da Tapada em Alcântara, mesmo junto à actual Junta de Freguesia e Mercado por baixo da Ponte 25 de Abril, esta escola e as respectivas pinturas murais, que existem em todas as salas, sofreram já não uma mas duas recuperações, uma em 1956 e outra entre 2012, tendo as obras acabado e a escola sido "re-inaugurada" em Setembro de 2013. Tinha uma curiosidade enorme de conhecer a escola e de ver, in loco a pintura mural do Mestre António Soares, realizada a convite do seu grande amigo, o Arquitecto Raúl Lino.

Fui muito bem recebida, tendo em conta que não tinha marcado nada com a direcção da escola, pela Professora Ana Gomes. Depois de me identificar e de explicar o que tinha ido lá fazer, ela fez-me algumas perguntas muito curiosas e surpreendentes - que ficarão para um outro post - acerca das pinturas, que tive o prazer de responder e esclarecer, e fez-me uma visita guiada deixando que fotografasse (de forma sumária porque não levava equipamento adequado), por forma a documentar-me, e a ficar com um documento actualizado relativamente às fotografias que possuía, muito mais antigas e a preto e branco.

As fotos a preto e branco pertencem à colecção da família, julgo que serão dos finais dos anos cinquenta, antes da primeira intervenção:






Eis agora as imagens da recuperação efectuada em 2012:



 












 























A Professora Ana Gomes foi também muito amável e direccionou-me para a Junta de Freguesia, onde tomei conhecimento de qual foi a empresa responsável pela recuperação da obra de arte, a quem contactarei mais tarde, por forma a obter imagens melhores de como estavam as pinturas antes e depois. Nessa altura actualizarei a informação deste post.

Ao ver as imagens, não pude deixar de pensar na quantidade de crianças, entre os 6 e os 10 anos que passaram por esta escola e por estas imagens, quer estas que aqui apresento, quer os desenhos lindíssimos também do Arquitecto Raúl Lino, que embelezam cada sala de aula. Curiosamente esta pintura mural, que preenche três paredes, fica precisamente num "local de passagem" ou de "deambulação" - fica precisamente no átrio que dá acesso da Portaria às salas de aula do rés-do-chão e à escadaria de madeira que leva às salas de aula do primeiro andar.

O nome da pintura mural é, muito precisamente "Os Ofícios de Alcântara", e retrata as actividades principais que existiam nessa altura - 1918 - em Alcântara. Todo o friso, que fica bem mais de 1,5m acima das portas (a escola tem um "pé-direito" muito alto), e as imagens, transmitem, ainda hoje, 95 anos depois da sua realização, uma força e uma energia extraordinárias!


"Ascenção de Nossa Senhora" - Seminário Maior dos Olivais

Aqui há dias, o Reverendo Padre Reitor José Miguel Pereira, do Seminário Maior dos Olivais confirmou-me que sim, que existe um quadro do Mestre António Soares mas que, ao contrário do que eu própria julgava, se encontra não no Altar-Mor da Capela mas no local ou antecâmara que designam por Deambulatório.


Foi curioso pois quando num primeiro contacto telefónico o inquiri, o Reverendo Padre Reitor garantia-me que não existia nenhum quadro do Mestre António Soares, no Seminário. Referiu-me agora que é um local onde sempre se recorda de ter visto esta pintura, mas que não fazia sequer ideia de quem era o autor.

Na colecção da Família, existe um estudo, que o Pintor fez para o rosto da Nossa Senhora, uma belíssima sanguínea:


Vejam só o privilégio de deambular, em oração ou meditação, junto a tão magnífico quadro!

1 de setembro de 2013

Inventário ou Catálogo Raisonné... da obra do Mestre António Soares

Já aqui tenho feito referência, em vários notícias, ao "Inventário"... E o que é o "Inventário"? Normalmente também se pode utilizar a palavra mais internacional, francesa, "Raisonné", que significa sensivelmente o mesmo, que é a listagem detalhada, com várias entradas e referências bem como com reproduções (ou não), da obra de um artista plástico, ou de um grupo de artistas, por exemplo.

Normalmente os artistas são... "artistas", isto é, temos na ideia que são pessoas um pouco alheadas dos aspectos práticos e mais "comesinhos" do dia-a-dia. Algumas vezes esta imagem é exactamente verdadeira e correcta, e designa na maior parte das vezes, muitos dos "artistas" que se tornaram mais conhecidos mundialmente. Assim como artistas menos conhecidos. 

Aliás até há "artistas"... sem obra... os "verdadeiros artistas"...

Mas nem sempre tem de ser, ou é, assim. Posso dar um exemplo maisto recente, por exemplo do artista austríaco, Friedensreich Hundertwasser, que faleceu há poucos anos, que até nem ligava muito ao facto de ter ou não dinheiro para comer ou se vestir, mas que foi um dos primeiros verdadeiros Ecologistas! Porém tinha sempre o maior cuidado na numeração e contabilização de todas as suas obras de arte, quer fossem serigrafias, que conseguia tornar únicas cada uma das unidades de várias séries, quer os seus magníficos quadros, quer painéis de azulejos - temos o privilégio (todos os cidadãos) de poder admirar um magnífico painel no Metropolitano da Gare do Oriente - quer projectos de arquitectura...

Vem esta referência a propósito da obra do Mestre António Soares. Efectivamente, desde a sua morte há trinta e cinco anos, tem vindo o seu irmão, Américo Soares, a elaborar o "Inventário" ou "Raisonné" de toda a obra, a partir de Catálogos das exposições Individuais e Colectivas, das reproduções (fotos) a partir do advento da fotografia, mas principalmente a partir de um instrumento precioso e inusitado (tendo em conta a "definição de artista" acima): das suas agendas.

Efectivamente o Mestre António Soares, que para além da sua paixão pela pintura, não teve Pai rico que o sustentasse e teve de viver do seu trabalho, tornou-se (por temperamente ou por necessidade) numa pessoa muito organizada que registava toda a sua vida em agendas que, felizmente, nunca deitou fora! A cada dia, em agendas grandes, de tamanho aproximado a folhas "A4", registava todas as saídas e entradas de dinheiro, desde o pão, os sapatos que tinham ido ao sapateiro, a conta paga ao talhante ou... "o quadro xxxxx vendido por $$$$$ ao Sr. Fulano". (verdadeiramente a "inveja" de qualquer investigador)...

Mas não foi só isso o espólio do grande artista. Tinha também o cuidado desde muito jovem, de guardar todas as referências às exposições, os artigos de jornal, as críticas, e... imensa correspondência!

Correspondência de amigos, de colegas, de coleccionadores, desde 1912 e anteriores... Há postais e cartas que, sem códigos postais iam ter às mãos do destinatário: cartas dirigidas "Ao Pintor António Soares, Café A Brasileira do Chiado, Lisboa". (testemunhos fantásticos!...)

Depois da Biografia completa, está na nossa ideia a publicação de "Correspondência", e em função da oportunidade, ou do interesse que possa vir a ser demonstrado, mais publicações relativas a grupos de obras ou a épocas, a tipos de actividade - está em estudo, por parte do Museu Nacional do Teatro, a elaboração de um Raisonné da obra do Mestre António Soares em tudo o que ao Teatro diz respeito, onde ele trabalhou durante muitos anos.

Mas mais recentemente, através da Internet, também me tem sido possível recuperar imagens de obras das quais não tinhamos referências ou imagens, pelo que o "Inventário" está sempre a ser actualizado.

Bom seria que os proprietários de colecções particulares nos contactassem a fim de podermos actualizar as imagens das obras que possuem. Também para efeitos de autenticação de obras, neste momento, a Família do Mestre António Soares, é a entidade mais idónea e credível de autenticação de obras de António Soares!

Vamos continuar a trabalhar nesse sentido, de descobrir e dar a conhecer onde se podem encontrar, em locais públicos, obras deste grande pintor do século XX.


Painéis temáticos na Escola Secundária Dr. Solano de Abreu...

com frases retiradas de "Os Lusíadas", de Mestre António Soares.


Antes de ir a Abrantes ver ao vivo os magníficos painéis, executados por encomenda da Junta dos Liceus em 1958, aquando da inauguração das novíssimas instalações da Escola Industrial de Abrantes, já havia encontrado imagens dos mesmos, mesmo que não devidamente identificados, na internet. A antiga Escola Industrial e Comercial de Abrantes, depois Escola Secundária Nº.1 de Abrantes, e actualmente, Escola Secundária Dr. Solano de Abreu, continua por tradição a formar técnicos e a ensinar ofícios, tal como foram tão magníficamente ilustrados pelo Mestre António Soares. As imagens abaixo, permitem ficarmos com uma ideia da grandiosidade dos painéis, e da beleza dos mesmos.





Estas imagens foram tiradas aquando da cerimónia de entrega de diplomas do Centro de Novas Oportunidades da Escola Secundária Dr. Solano de Abreu, em Junho de 2012 (http://cnoessa.blogspot.pt/2012/06/no-dia-6-de-junho-pelas-21-horaso.html).





Foi nos finais de Maio deste ano de 2013, que tive oportunidade de ir à Escola Dr. Solano de Abreu. Não tinha marcado entrevista prévia mas fui mais uma vez muitissimo bem recebida, desta vez pelo (ainda) Director da Escola, Dr. Jorge Costa (que aparece a dirigir a mesa, na mesma cerimónia acima referida, e onde se pode ver um detalhe do painel da direita).


A minha intenção, mais uma vez, era averiguar do grau de conservação dos painéis, apresentar-me e deixar contactos para futuros eventuais encontros ou outras acções de sensibilização para a obra do Mestre António Soares. Comecei a conversa por me congratular junto do Dr. Jorge Costa, por me parecer que, nesta escola, tinham realmente conservado e colocado em evidência os painéis que foram executados nos finais dos anos cinquenta, aquando das obras de execução da remodelação do Parque Escolar.

Surpreendentemente, o Dr. Jorge Costa corrigiu-me e, depois de ter explicado que era professor do grupo de Desenho, acrescentou que tinha sido ele mesmo a fazer "finca-pé" porque logo de início, mais uma vez julgo que por total desconhecimento de quem é António Soares por parte dos projectistas do Parque-Escolar - o grande auditório fica localizado no corpo mais á direita, na foto, a intenção era simplesmente deitar abaixo os dois painéis.

Por corajosa determinação do Dr. Jorge Costa, estes foram colocados em evidência e o antigo Ginásio onde os painéis se encontravam inicialmente foi transformado num magnífico Grande Auditório da Escola Secundária Dr. Solano de Abreu. E, como as imagens documentam, ficou a Escola e toda a comunidade a ganhar um espaço de excelência! Bem haja, Dr. Jorge Costa.

Logo que haja oportunidade serão colocadas aqui no blog mais imagens com mais pormenor, dos painéis.


31 de março de 2013

Capas de Revistas

Mestre António Soares, logo que teve oportunidade, primeiro com António Ferro, João de Barros e João do Rio, na ATLÂNTIDA, na CONTEMPORÂNEA, e mais tarde nas revistas mais periódicas mas também mais populares como a ILUSTRAÇÃO PORTUGUESA e a REVISTA ABC, passando por alguns mensários como o MAGAZINE BERTRAND, foi executando e fazendo capas, pois era um "ganha-pão" mais imediato, e sempre necessário...

Mas a qualidade era sempre exemplar e vou apresentar exemplos, com a devida vénia à Hemeroteca da Câmara Municipal de Lisboa (segue link abaixo) e à Fundação Calouste Gulbenkian, pois alguns originais são pertença da colecção permanente do CAMJAP.

Aqui está um lindíssimo cartaz, de 1918.

E estes da ILUSTRAÇÃO PORTUGUESA, DE 1920:






















Saliento a economia de cor, que tem a ver com exigências da produção, obviamente, mas que são tão bem resolvidas, nestes vários exemplos, como noutros que se seguirão...


Retrato da Mulher do Artista - Retrato da Irmã do Artista

Está patente desde 12 de Julho de 2012 até 7 de Abril de 2013 na Exposição Permanente do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão da Fundação Calouste Gulbenkian - Galeria 1, quer a "Natacha" quer este belíssimo retrato a óleo de 1932, de Maria Germana, com 27 anos, mulher do Mestre António Soares.
Por um lapso dos serviços da CAM este retrato - que é definitivamente o retrato da mulher do artista - aparece como "Retrato da Irmã do Artista", 1937. Aqui fica a rectificação.


Apresentamos a seguir mais dois retratos quer da mulher do Mestre quer da irmã, para se comprovar a impossibilidade da semelhança.

Em primeiro lugar o "Retrato da Irmã do Artista" a óleo, de 1936, aqui representada com 22 anos, que está no MNAC - Museu do Chiado:


E agora uma sanguínea lindíssima das duas jovens senhoras, da colecção da Família:



À esquerda aparece Judite, a irmã do Mestre (1914/1938) e à direita D. Maria Germana (1905/1996) e está inventariado como "Mulher e Irmã do Autor" e datado de 1933.

28 de março de 2013

Exposição Internacional de Paris de 1937 - "Lisboa"

Com a devida vénia à Biblioteca de Arte da Colecção Calouste Gulbenkian, e ao Estúdio Mário Novais (segue abaixo o link), apresento a reprodução do quadro que ganhou o Grand-Prix de Pintura na Exposição Internacional de Paris em 1937:

"Lisboa" de António Soares


Existe uma reprodução a cores (que está no site www.mestreantoniosoares.org) mas que não tem suficiente qualidade para se poderem analisar detalhes. E isto porquê?  
Porque este quadro foi destruído no incêndio que ocorreu no Museu de Arte Popular (que fica ao lado do CCB) em 1976, onde este quadro esteve em lugar de destaque, desde que regressou de Paris, na designada  "Galeria Nacional de Arte Moderna".

Vale a pena ver também o post com o mesmo nome: Exposição Internacional de Paris de 1937.

(link: http://www.flickr.com/photos/biblarte/4996129588/in/set-72157624844432503)

Os Quadros da Brasileira do Chiado

Em 1921, António Soares é convidado a participar e acaba a coordenar a distribuição dos temas para os quadros da Brasileira do Chiado, pelos vários colegas / colaboradores, e realiza dois quadros que contêm pessoas da sociedade lisboeta da época e que eram habitués a frequentar a Brasileira. Um dos quadros representa elementos femininos (Botequim) e o outro, elementos masculinos (Cena de Café) - sabemos que um deles está, hoje em dia, numa colecção particular em Lisboa (este quadro - o das figuras femininas ainda não foi encontrado). Os dois quadros serão apresentados no I Salão de Outono da Sociedade Nacional de Belas Artes em 1925.  
No quadro dos elementos masculinos, começa por esboçar o perfil de Fernando Pessoa mas este, depois de questionado, pede delicadamente a António Soares que não o inclua no grupo, até porque o café que frequentava mais assiduamente era o "Martinho da Arcada". Julgamos nós que seria por convicções pessoais, por não gostar de ser retratado, ou por pertencer aos "Rosa-Cruz". 
António Soares, porque dedica a Fernando Pessoa um grande respeito e amizade acaba por aceder ao pedido do amigo e retira a sua imagem do quadro, não sem antes fazer uma fotografia, que aparece abaixo, absolutamente datada pois a criança que está à frente do quadro é a irmã de António Soares, Judite, que teria à data cerca de 10 anos.

Fica aqui a fotografia, inédita:


(foto colecção da Família de António Soares)

4 de março de 2013

Painel temático na Escola Secundária Ferreira Dias



com as bandeiras representando os símbolos dos cursos leccionados na antiga Escola Técnica de Sintra, à data da sua execução - 1964
  
Foi um enorme prazer a minha primeira visita à Escola Secundária Ferreira Dias em Agualva – Cacém. A minha intenção era, em primeiro lugar, averiguar do estado de conservação do enorme painel realizado por encomenda pelo Mestre António Soares em 1964 (quando foram edificadas as novas e actuais instalações), e contactar com a Direcção da Escola no sentido de solicitar autorização para reproduzir e publicar informação sobre o mesmo.


Fui muitíssimo bem recebida, desde o início, pelo Vice-Director da Escola, que estava mesmo na entrada, Dr. Reis Martins. Sorte a minha de ter logo encontrado a pessoa que ao longo dos anos mais se tem batido pela preservação do magnífico painel que esteve em riscos de vir a ser destruído (queriam deitar abaixo aquela parede), caso tivesse havido dinheiro para se levar a efeito as obras de remodelação do Parque Escolar. Depois de ter conversado algum tempo com o Dr. Reis Martins, julgo que tal nunca teria chegado a vias de facto, ou então o Parque-Escolar iria contar com um “Mártir pela Arte”. Também estou convencida (com grande pena minha) que fosse este um painel realizado por Almada Negreiros, e a Escola teria não só sido uma das primeiras a ser renovada, como o painel (que não pode ser removido da parede onde se encontra) seria eventualmente colocado num maior lugar de destaque (?)...

Fiquei a saber que a Escola tem levado a efeito ao longo dos últimos anos, várias exposições sobre este “desconhecido” autor do painel que tão bem embeleza a entrada principal da Escola, António Soares, quer na área de Artes e Design, quer na de História. Infelizmente, como muito bem sabemos e lamentamos, ainda não existe a publicação da Biografia Oficial e completa do Mestre António Soares (é o nosso objectivo prioritário) nem existe disponibilizado na Internet muito material – reproduções – de obras do Mestre.

Julgo que o prazer foi recíproco, pois na escola não sabiam que existe uma família e um espólio do Mestre António Soares, e que a Família tem vindo a realizar desde o falecimento do Mestre (há 35 anos) um levantamento e um inventário exaustivo da obra deste grande artista português do século XX.

Objectivamente constatei, em primeiro lugar, que o painel apresenta um excelente estado de conservação; em segundo lugar, que existe uma grande vontade da Escola em conhecer melhor este grande pintor do Modernismo; em suma, pode ser um bom começo para a dinamização e divulgação de quem foi António Soares, o que foi o período do Modernismo, em que lugar estavam todos os protagonistas desse movimento – posso dizer com toda a convicção e afirmá-lo em definitivo, tal como posso prová-lo, que Almada não foi o maior, foi simplesmente um dos elementos do movimento do Modernismo Português.

Aliás, não se pode afirmar quem foi o maior, como não se pode dizer quem foi o primeiro, como não se pode dizer quem foi o pior ou o último. Um Movimento nas artes, como noutras actividades, é constituido sempre por vários artistas cujo trabalho no seu conjunto é que determina se existiu um Movimento ou se foram simplesmente manifestações esporádicas. Assim, no Movimento do Modernismo em Portugal, todos contribuiram para essa definição, e não só na pintura, no desenho, na publicidade, nos grafismos, mas também na escrita, e na arquitectura, exterior e de interiores, enfim na cultura em geral.

Continuo a afirmar, está ainda por fazer, por estudar a fundo e conscientemente, com uma visão e leitura mais objectiva e isenta, a História do Modernismo em Portugal.

Ficamos pois hoje mais enriquecidos com a publicação aqui, neste blog, com a devida vénia ao blog “riodasmacas.blogspot.pt”, de uma imagem magnífica (início do post) deste lindíssimo painel que se encontra na entrada, recepção, da Escola Secundário Ferreira Dias, tal como o vi na semana passada.

Imagem do Painel, pouco depois da inauguração da Escola - note-se a ausência do busto do Engº. Ferreira Dias

8 de fevereiro de 2013

SAGITÁRIO...

Um desenho lindíssimo (a) que esteve na génese da criação de uma "SAGITÁRIO - REVISTA PORTUGUESA DE ARTE E CRÍTICA", que nunca viu a luz do dia.

Esta foi, assim, a ideia base para a criação deste blogue...

(a) excerto do original

Natacha - Retrato de uma Bailarina


Considerada por José-Augusto França a obra-prima de António Soares, este "Retrato de uma bailarina", "Natacha", "Retrato de uma bailarina russa" ou simplesmente "Retrato", designações da mesma obra em diferentes Catálogos de exposições individuais e colectivas, é uma têmpera sobre tela datada de 1928. Foi com esta obra que Mestre António Soares obteve o seu 1º Prémio de Desenho da XXVI Exposição de arte na SNBA - Sociedade Nacional de Belas Artes, em 1929. (a)

Adquirida pela Fundação Calouste Gulbenkian ao coleccionador e empresário Fernando Seixas - que a adquiriu para evitar que fosse levada para a América Latina por um outro coleccionador particular - mais tarde vem a pertencer ao acervo inicial da colecção de obras do Modernismo do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão - inaugurado em 1983. Hoje em dia, faz parte da colecção permanente deste precioso espaço museológico, detentor de um importante acervo de obras de Mestre António Soares.

Sendo precisamente considerada uma das obras mais carismáticas quer do autor, Mestre António Soares, quer do Movimento Modernista Português, não esteve presente na exposição "O Modernismo Feliz - Art Déco em Portugal" do MNAC - Museu do Chiado em 2012, simplesmente por se encontrar nesse segundo semestre de 2012, em período de manutenção. Mas foram cedidas outras obras da colecção do CAMJAP, assim como de outros espaços museológicos do país.

Esta bailarina "russa", mais precisamente, estoniana, Natacha Baltina, esteve em Portugal com a Companhia de Bailado de S. Petersburgo. Acabou por se apaixonar e casar com um membro do corpo Diplomático da Embaixada de Cuba em Lisboa, o diplomata Eduino Mora. A amizade que teve início na pintura do retrato prolongou-se durante muitos anos, entre as duas famílias, e o casal, sem filhos, manteve visitas regulares a Portugal e à família António Soares. Quando morre, anos mais tarde, Natacha vem a ser enterrada em Lisboa.

(a) in "O Notícias Ilustrado", pág.8 de 26 de Maio de 1929, artigo de Augusto Ferreira Gomes: "(...) Desde os desenhos assinados simplesmente António - já lá vão 15 anos - até à tela que esta época expôs nas Belas Artes - trabalho este demonstrativo de conhecimentos profundos de pintura - (...) António Soares pode orgulhar-se de ser um grande pintor em qualquer parte do mundo(...)", 1ª. medalha em "Desenho" com o quadro "Natacha".

António Soares traz à pintura portuguesa uma expressão nova de beleza

por Artur Portela

Valeu a pena este silêncio de catorze anos! Dir-se-ia que o talento de António Soares no isolamento, na ascese e até mesmo na contradição, atingiu a plenitude criadora. Durante esse tempo, o artista como que requintou a sua maneira, descobrindo novas refulgências de beleza, novos acordes de tonalidades, novas expressões de beleza. Esta sua exposição (9ª exposição individual), seja qual fôr o prisma crítico, é um notável acontecimento artístico.

António Soares como que criou o seu mundo, numa síntese admirável de formas e de côres. Através da sua sensibilidade, tão finamente espiritual, que sabe converter a realidade em sonho, António Soares alarga, de certa maneira, as fronteiras da escola estética em que nasceu, para lhe dar uma realidade eloquente. Por outras palavras mais simples: todas as experiências, aquisições, e "recherches" do modernismo, decantados pela sua maneira, traduzem-se em extraordinários conceitos plásticos, de serenidade ideal, que acusam ou vibram, com o toque maravilhoso da obra prima. Evidentemente que nem todos os seus quadros apresentados são dum significado igual. Mas a maior parte, a grande parte, devemo-la considerar indiscutível.

António Soares é um complexo bizarro e rico de valores. A sua pintura, tão aliciante, tanto nos evoca a graciosidade "mievre" dos grandes artistas do século XVIII - e, nomeadamente, dum Watteau estilizado, como as extraordinárias sugestões de côr, dos cenários dos bailarinos russos, quando Nijinsky dançava pelo mundo. Esta galeria é, sobretudo, uma alta manifestação de pura espiritualidade. Um grande músico pintaria como Soares, convertendo as notas em magias cromáticas. As suas mulheres têm a aristocracia, a raça, a elegância, a finura e a distinção dos tipos excelsos que abrem novos paradigmas à beleza. Dentro daquela maneira que revela uma personalidade, é impossível fazer-se melhor. António Soares como que se resgata da sua misantropia, obtendo uma vitória clamorosa e definitiva. Supomos que o artista não pinta sobre tela, mas num pano especial, ligeiramente, tinto, cuja superfície suave, macia, dá mais fluidez aos pincéis e funde melhor os valores da paleta. Havia que elogiar muito, quasi tudo, desde a "Natacha", que define um singular tipo de mulher de olhos errantes e nostálgicos, até as suas naturezas mortas, tocadas com subtil preciosidade. O "Camarim" é uma autêntica maravilha, ante a qual os olhos ficam tontos de assombro, de emoção. É, simplesmente, lindo, aquele "boudoir" em que a figura tem alguma coisa de floral. "Bailado Romântico" é duma extraordinária, duma enfeitiçada magia de tinta. As duas figuras, entre rompimentos de luz sobria e surda, traçam uma admirável parábola. "Composição" é outra obra a destacar. António Soares transpôs, se não renovou, a técnica dos Gobelins, mas pintor sempre, deu-lhe uma expressão de suprema elegância decorativa. "Vindimadora", "Alto Longo", "Entre Bastidores", "Atrás do Rompimento" são, entre outros, obras que fixam a perfeição que António Soares atingiu.

Um grande pintor e uma grande obra. Estamos certos de que, no salão da Rua Ivens, Lisboa teve, ocasionalmente, uma verdadeira sala de museu.

in DIÁRIO DE LISBOA, 1944








23 de janeiro de 2013

"O Modernismo Feliz - Art Déco em Portugal" - Exposição no MNAC - Museu do Chiado de 28 Junho a 25 Novembro de 2012


Foi a imagem deste pequeno quadro de António Soares ("No terrace du café des plaires"), que pertence à colecção do Museu do Chiado, que serviu de inspiração para o Catálogo da Exposição. 

Prevista para encerrar a 28 de Outubro, acabou por se prolongar por mais 4 semanas, devido à afluência verdadeiramente excepcional (só em Agosto o Museu do Chiado teve mais de 22.000 visitantes) que reflete o interesse que Lisboa e o público em geral têm pelo tema e pelas obras dos grandes artistas portugueses do século XX.


Um autêntico êxito! Está de parabéns o Museu do Chiado, e está de parabéns o Comissário da Exposição, um verdadeiro entusiasta do Movimento Modernista Português, e também apaixonado pela obra do Mestre António Soares, o Dr. Rui Afonso Santos!

17ª Exposição Individual - Galeria da Academia Dominguez Alvarez, Porto - 1961

“O ensino de gravura-artística na Academia Dominguez Alvarez e a abertura da Exposição de desenhos e pinturas de Mestre António Soares”

Novembro de 1961

A Academia Dominguez Alvarez iniciou a nova temporada de actividades, com dois acontecimentos de vulto para o meio artístico portuense. Um, foi a inauguração da oficina-livre de gravura artística, dirigida pelo pintor D’Assunção, e que já está a ser frequentada por vários “alunos”, entre os quais alguns da Escola de Belas Artes; outro, a abertura da exposição de desenhos e pinturas de Mestre António Soares, que juntou na Academia Dominguez Alvarez dezenas de intelectuais tanto das letras como da Poesia e das Artes Plásticas. Companheiro de Jorge Barradas, Almada Negreiros, Canto da Maia, Christiano Cruz, Mário Eloy e Eduardo Viana, o Mestre António Soares é, presentemente, um dos mais representativos valores portugueses, estando representado em museus e pinacotecas particulares de Portugal e do estrangeiro, bem como no Gabinete da Presidência do Conselho no Palácio da Assembleia Nacional, nos Paços dos Duques de Bragança, em Vila Viçosa, no Patriarcado de Lisboa e na Capela do Cristo-Rei do Seminário dos Olivais, sendo detentor do “Grand-Prix” de Paris, da “Medalha de Honra” da Feira Internacional de New York, primeiras medalhas de desenho e pintura da S. N. de Belas Artes e do “Prémio Columbano”. O Governo Português distinguiu-o também com a "Ordem de Santiago e Espada”.

No acto inaugural da Exposição de António Soares, o pintor Jaime Isidoro saudou o ilustre Mestre, dizendo:

Se a hora a que nos reunimos para inaugurar esta exposição me obriga, de facto, a dizer “boa-tarde”, a qualidade, a frescura, a permanente juventude, aliciante e comunicativa, da obra exposta, que sugere perfumada e luminosa manhã de eterna Primavera, leva-me a esquecer a posição dos ponteiros no relógio que regula o tempo e orienta a vida, impondo-me este desabafo sincero, saído do fundo da alma:

- “Boa-tarde!”, Senhoras e Senhores.

- “Bom-dia!” Querido Mestre.

As pessoas aqui presentes, que representam muitos e dos bons admiradores da Arte como esta, com características de uma singular e nobre expressão, vieram à Academia Dominguez Alvarez para levarem os olhos e o espírito com tão sublime atmosfera; com esta pequena parcela de trabalhos do Mestre António Soares, constituída, no quase todo, por estudos e desenhos preparatórios de algumas das suas obras que nos falam alto e claro do sonho do Artista – sonho de meio século, suave e puro, sem sombra de pesadelos a perturbar-lhe a ascensão gloriosa no panorama da Arte.

É para essa ascensão gloriosa, reconhecida pelos valores responsáveis dos meios artísticos de Portugal e do estrangeiro; é para essa ascensão gloriosa que os júris nacionais e internacionais têm distinguido com altos galardões, que a Academia Dominguez Alvares, convencida que presta um serviço à cultura, pretende chamar a atenção do público nortenho, esperando que ele desfile por estas salas com interesse e carinhosa devoção, prestando assim, com a sua presença consciente, mais uma e sempre merecida homenagem a quem, como o Mestre António Soares, tem sabido servir a Arte com verdadeiro amor, dando-lhe vida, dando-lhe espírito e dando-lhe alma com inspirado carinho e com um certo, requintado e poético sentido criador.

Ao saudar o ilustre Artista que acedeu ao meu convite, e ao agradecer a presença de quantos quiseram dar o seu apoio moral, vindo, como visitante, à Academia Dominguez Alvarez, eu quero terminar conforme principiei:

- “Boa-tarde!”, Senhoras e Senhores.

- “Bom-dia!”, - Querido Mestre.




Por sua vez, o Mestre António Soares usou da palavra para fazer oportunas e judiciosas considerações, sublinhando:

São de reconhecido agradecimento a Jaime Isidoro, Director da Galeria Dominguez Alvarez, as primeiras palavras que tenho a honra e o grato prazer de dirigir aos visitantes da minha décima-sétima exposição, por tanta gentileza e cativante interesse em efectivá-la na sempre bem acolhedora capital do Norte. Como longínquo romeiro da fé na amizade e nos fastos da beleza evocadora, é sempre com emoção que venho avivar aqui, o sentimento de fraternal convívio à lareira nortenha, ao secular granito da invicta muralha da fundação e também à singela esteira de lages das ruelas e escadarias da ribeira do velho burgo. Foi com efusivo entusiasmo que aceitei o convite de Jaime Isidoro, e alvoroçado agrupei o conjunto de trabalhos que ora vos apresento e tanto diligenciei, embora resumidamente, significar o largo adágio de quarenta e seis anos de actividade artística, o que equivale a dizer-vos… de sonho.
 

Publicado em “Jornal Feminino” – Secção A Mulher

 
Das palavras acima transcritas, saliento um facto extremamente interessante, a nível psicológico e sociológico: quando António Soares, em 1961, com 67 anos de idade se refere a “quarenta e seis anos de actividade artística”, é fácil fazer as contas e chegar à conclusão de que ele se considerava um profissional pleno desde os seus… 15 anos!

O que quero com isto salientar é o facto de, actualmente, estarmos tão condicionados a considerar que um profissional só o é verdadeiramente “depois dos 18 anos” ou mesmo ainda mais tarde, então o que dizer deste grupo de jovens (Jorge Barradas, Christiano Cruz, Almada Negreiros, Canto da Maia...) que tanto “barulho” fazia nos seus verdes anos, contra as ideias “bolorentas” e tão “bota-de-elástico” da época; que provocaram a reacção do público com o humorismo satírico e vernáculo patente nas 1ª e 2ª Exposições dos Humoristas Portugueses, em 1912 e 1913… tão jovens!

E que geração fantástica!

E se trabalhavam!... António Soares, a quem o Pai tinha posto fora de casa por considerar que a sua teimosia em querer viver da sua própria arte, da pintura e do desenho, não era coisa de pessoa séria… e que anos mais tarde, vem a ser o provedor de toda a família, e inclusive do seu próprio Pai que, enganado por um sócio manhoso, perde todos os bens… (mas isto já é outra história).

Todos eles, todos estes artistas, pintores e desenhadores de génio, se fartaram de trabalhar – era tudo feito à mão, não por computador - no teatro (cenários, figurinos, cartazes), em publicidade (o que hoje em dia se designa por “graphic design”) de Vinhos, de Cintos, de Discos, de Bolachas, de Revista (capas e não só, também publicidade no interior) enfim no que aparecesse...